CSP Conlutas – Fevereiro de 1917, 08 de Março em nosso calendário, Rússia, operárias têxteis e mulheres pobres iniciam uma grande mobilização cujo mote é a exigência de pão. O país vivia a miséria provocada pela 1ª guerra mundial e o levante das mulheres, em três dias, conduziu o país a uma greve geral que foi o estopim de uma revolução socialista vitoriosa. As mulheres participaram ativamente do processo revolucionário e conquistaram, nos primeiros anos da revolução, muito mais do que qualquer país capitalista ofereceu em toda a sua existência.
Julho de 1917, Brasil, acontece a 1ª greve geral no país. A maioria da classe operária é composta por imigrantes, dentre eles 67% são mulheres que atuam no setor têxtil. As reivindicações eram melhores salários, jornada de trabalho de oito horas, direito a férias, fim do trabalho infantil, proibição do trabalho noturno para as mulheres, aposentadoria e assistência médica. Nesse período as mulheres queixavam-se de serem espancadas pelos mestres de fiação. Não é de se espantar que elas tenham participado ativamente da greve, com métodos de radicalidade como expressa um jornal da época “Uma multidão de garotos, afirmou o jornal O Estado de São Paulo, se entregou à todos os excessos, escolhendo para alvo de suas loucuras os carros elétricos (…) E o que é mais deplorável, é que um bando de mocinhas, infelizes operárias de fabricas, imitou os gestos da garotada, tomando conta de três elétricos no Largo da Sé”.
Outubro de 1975, Islândia, 90% das mulheres decidem parar suas atividades em defesa de direitos iguais. Negaram-se a cozinhar, cuidar da casa e dos filhos, não foram aos locais de trabalho, juntaram-se em milhares nas manifestações. A greve teve repercussão massiva e colocou o país entre os que mais avançaram em direitos democráticos para as mulheres. O limite dessas conquistas foi ter ficado no marco da sociedade capitalista, mas não se pode negar a força da mobilização das mulheres.
Os fatos acima são apenas exemplos de como as mulheres construíram mobilizações centrais para fazer avançar a classe trabalhadora de conjunto e para garantir conquistas na luta contra o machismo e a exploração capitalista. O machismo como ideologia está colocado para as mulheres desde sociedades anteriores ao capitalismo, mas foi nesse sistema que se formou uma combinação perversa de opressão e exploração que faz com sejam elas o alvo de grande parte da crueldade da sociedade baseada no lucro.
A entrada das mulheres no mercado de trabalho se deu com a incorporação de toda a carga de preconceitos e argumentos para atestar sua inferioridade. Patrões e governos se aproveitaram para manter sob a responsabilidade feminina o cuidado quase que exclusivo dos filhos, da casa e dos idosos, deixando assim de gastar com a construção de creches, lavanderias, restaurantes públicos e nos locais de trabalho. Também se beneficiam ao pagar menores salários para as mulheres nas mesmas funções que homens, na imposição de uma jornada de trabalho mais extenuante e adoecedora.
Dentro e fora dos locais de trabalho se reforça a lógica da mulher como objeto sexual, que tem por objetivo satisfazer sempre aos desejos sexuais masculinos. Não é a toa que elas são as principais vítimas de assédio sexual, que os números de estupros crescem e que, cada vez mais, essa pratica é naturalizada nos meios de comunicação e na sociedade de modo geral.
O aprofundamento da crise econômica escancara a condição das mulheres
Muitos anos se passaram desde que as mulheres começaram a exigir direitos iguais dentro do capitalismo, e assim como para o conjunto dos trabalhadores, em alguns momentos elas também foram alvo de políticas que acenavam com progresso. Contudo, todas essas conquistas ruem feito terra no primeiro tremor na base dos lucros dos empresários.
É o que estamos observando acontecer frente ao aprofundamento da crise econômica mundial. A Organização Internacional do Trabalho- OIT- apresentou relatórios cujo conteúdo aponta que desde o início dessa crise, as mulheres vêm sendo as mais afetadas com o desemprego. Entre 2002 e 2007, antes da crise, a diferença na taxa de desemprego mundial entre mulheres e homens era de 0,5 pontos percentuais, no período seguinte 2009-20012 aumentou para 0,7%.
Nesse período vimos aumentar os dados de prostituição de mulheres na Europa, principalmente entre as imigrantes. Houve ainda setores que defenderam a volta das mulheres ao lar para garantir emprego aos homens. Uma pesquisa feita pelas organizações Plan International e Overseas development institute aponta que o encolhimento econômico mundial aumentou a mortalidade infantil de meninas e levou mais mulheres a sofrerem abusos e a passar fome. A pesquisa afirma que a proporção de meninas que morreram desde o início da crise global aumentou cinco vezes mais rapidamente que a proporção de mortes de meninos.
Nos Estados Unidos, onde explodiram mobilizações impulsionadas pelo chamado das mulheres, contra a política opressora de Donald Trump, as mulheres já vêm sofrendo ataques em seus direitos há muito tempo. O último informe do comitê econômico do congresso norte americano (Abril, 2016) aponta que as trabalhadoras desse país recebem apenas 79% do salário dos homens, desde 2007. Para as mulheres negras e latinas a situação é bem pior, pois elas recebem respectivamente, 60% e 55%, da renda dos homens. O que torna a lei de salário igual, aprovada no país em 1963, sem efeito para grande parcela da população.
Outra lei que está no papel, mas que não representa garantias às mulheres, é o acesso ao aborto legal e seguro. Desde que foi aprovada, em 1973, outras 1.074 leis que visam limitar o acesso ao aborto foram aprovadas nos estados, 334 dessas restrições se deram a partir de 2010. Ou seja, republicanos e democratas, tem unidade quando se trata de atacar os direitos reprodutivos e trabalhistas das mulheres. Por isso, a maioria das mulheres negras não compareceu as urnas na ultima eleição, porque tinham noção do estrago que Trump faria, mas também não se sentiam representadas pela democrata que faz parte do 1% mais rico do mundo, Hillarry Clinton.
No Brasil, o aprofundamento da crise econômica tem deixado as condições de vida femininas ainda mais precárias. A taxa de desemprego entre as mulheres é de 12,7%, enquanto que para os homens é de 9,5%. Essa diferença corresponde a 33,6% de índice de desemprego. Em 2015, Vimos o país dar um salto no ranking internacional entre os países com maior número de assassinatos de mulheres, fomos da 7° para a 5º posição. Isso significa 13 mulheres assassinadas por dia. Essas vítimas tem cor e tem classe, pois 64% das mulheres mortas são negras e pobres. Uma pesquisa da Associação Nacional de Travestis e Transexuais do Brasil- ANTRA- afirma que a expectativa de vida dessas pessoas é de 35 anos, menos da metade da média geral que é de 79 anos.
Se todos esses ataques já vinham se dando desde o governo do PT e na administração da primeira mulher presidente no país, na gestão Temer a tentativa é de aprofundar ainda mais a opressão e a exploração. O projeto de reforma da previdência e trabalhista vão impor derrotas significativas para as mulheres trabalhadoras que verão seu tempo de contribuição e idade mínima para aposentar aumentarem; perderão o benefício da aposentadoria especial no caso das educadoras, além de perderem o direito de acumular benefícios no caso das pensionistas.
Todos esses ataques, que ocorrem desde a Europa, Estados Unidos, passando pelo Brasil tem o objetivo de colocar nas costas dos trabalhadores, em especial os setores mais oprimidos e mais penalizados, o preço da crise econômica, ou seja, para garantir os lucros de empresários e banqueiros, a classe trabalhadora deve apertar ainda mais o cinto.
Luta das mulheres: elas mostram o caminho da greve geral
Os planos da burguesia e seus governos daria muito certo se não houvesse um elemento central: a resistência impulsionada pelas mulheres, negros e negras, imigrantes, lgbt’s e desenvolvida por todos os trabalhadores. Em alguns embates se alcançou vitórias, em outros não. Mas o centro de avaliação é a disposição de luta que se expressa nesses setores.
Na Argentina, as mulheres chamaram um dia de paralisação contra a violência machista, os homens apoiaram e vimos manifestações gigantes no país inteiro, com a solidariedade em diversos cantos do mundo. Na Polônia, as mulheres convocaram uma greve, vestiram-se de preto e foram paras as ruas protestar contra um projeto reacionário de criminalização do aborto. Na Índia, costureiras do setor têxtil impulsionaram uma greve geral no país contra mudanças na lei previdenciária. No Brasil, as mulheres tomaram as ruas em todas as capitais exigindo o “Fora Cunha” e contra a cultura do estupro e naturalização da violência contra a mulher.
Para além dessas manifestações, foram muitas greves, ocupações de escola, trancamento de estradas e mobilizações que aconteceram nos últimos anos, dos quais as mulheres foram presença certa. Tudo isso, da conta de evidenciar o poder que a luta das mulheres tem de ser estopim para grandes movimentações das massas, além disso é notória a capacidade de combinar as pautas mais específicas, sentidas na pele pelas mulheres, negras e lgbt’s com os ataques que acometem a classe trabalhadora de conjunto. Essas duas habilidades devem servir para romper a dispersão das lutas e conseguir organizar nossa resistência de forma certeira.
Esse caminho começa a se desenhar e aponta para a construção de um 8 de Março histórico. Pois, embaladas pelas grandes manifestações de mulheres que aconteceram em Janeiro, nos Estados Unidos e no mundo, e por todas as expressões de luta que já vem acontecendo no período anterior, há uma convocação para uma greve internacional de mulheres nesta data. Paralisações que demonstrem que as mulheres não vão aceitar “Nem uma a menos, nenhum direito a menos”, manifestações que questionam o chamado feminismo empresarial, que a partir da retórica do empoderamento, só beneficiou as mulheres ricas.
No Brasil, nós do Movimento Mulheres em Luta, assim como diversos coletivos feministas, fazemos um chamado a sermos parte dessa construção. Vamos fortalecer os atos de rua no Dia Internacional de Luta da mulher trabalhadora e vamos dar a batalha para realizar paralisações em nossos locais de trabalho, que possam colocar em evidência a violência cotidiana que sofremos, da sociedade e dos governos. Vamos também parar nossas atividades em casa e nos somarmos as atividades.
É preciso que as mulheres trabalhadoras assumam seu lugar na construção da greve geral em nosso país, que junto com as centrais sindicais, mas também com os movimentos populares e de combate as opressões possam derrotar o governo Temer e todos aqueles que nos atacam, barrar as reformas da previdência e trabalhista, e exigir mais investimento nas políticas públicas de combate a violência machista. Não temos medo de desafios, que venha o 08 de março para iniciarmos um grande processo de mobilização no país. Motivos não faltam para pararmos tudo e invertermos a lógica vigente imposta pelos governos e empresários.
NEM UMA A MENOS, NENHUM DIREITO A MENOS. GREVE GERAL JÁ CONTRA AS REFORMAS E A VIOLÊNCIA!
FORA TEMER, FORA TODOS QUE OPRIMEM E EXPLORAM AS MULHERES!
Marcela Azevedo, da Executiva Nacional do Movimento Mulheres em Luta